terça-feira, 3 de agosto de 2010

O narcisimo nos dias de hoje

O Mito de Narciso conta a história do jovem Narciso, filho do deus-rio Cephisus e da ninfa Liriope, um jovem de beleza indiscutível. Ao ver sua imagem refletida, pela primeira vez, em um rio, Narciso morreu afogado, tentando tocar seu próprio reflexo. Morreu por admirar a própria beleza.

Esse mito me faz pensar um pouco em nossa sociedade atual, na qual o físico muitas vezes é mais valorizado que o intelecto. Possuir boa aparência tornou-se virtude importante, e isso faz com que muitas pessoas (em sua maioria, mulheres) ponham sua própria saúde em risco ao submeterem-se a cirurgias plásticas ou lipoaspirações sem autorização médica. Sou completamente a favor de pequenas intervenções cirúrgicas desde que haja a devida segurança, quando a operação beneficiar a mulher e puder elevar sua auto-estima. No entanto, há casos de mulheres hipertensas, por exemplo, que se submetem a cirurgias de lipoaspiração mesmo sabendo que estão pondo em risco a própria vida, ou, em outros casos, de mães que optam por não amamentar seus filhos para que seu seio não sofra qualquer tipo de modificação.

Para a psicologia, o conceito de narcisismo diz respeito a voltar amor para si próprio. O excesso ou a falta desse “narcisismo” caracterizaria, portanto, uma patologia. Imaginemos uma gangorra. É assim que a energia libidinal deve voltar-se, ora para si, ora para o outro. É extremamente saudável a nível psíquico que a pessoa possa cuidar de si, fazer algo de que gosta, dormir bem, tirar férias, reservar horas de lazer durante a semana. Da mesma forma, é importante que se possa, em outras situações, ajudar o outro, se voltar para o próximo, oferecer carinho. Quando bem “ajustada”, a gangorra do narcisismo faz com que saibamos qual o limite de pensar em nós mesmos (e isso inclui cuidar da própria imagem) e de pensar no outro. Entretanto, nossa sociedade atual vem valorizando em demasia os atributos físicos, a “juventude eterna” e a beleza, de forma que valores acabem sendo trocados por muitos de nós que convivemos nessa sociedade.

É importante parar um pouco para pensar a que lado estamos investindo nossa energia narcísica. É fácil encontrar pessoas que trabalham tanto, por exemplo, que não possuem nem mesmo tempo para cuidar de si, ficar com a família, sair com os amigos. Assim como há aqueles que se preocupam tanto com seu próprio “mundo” que não conseguem perceber o outro. O excesso, tanto de um lado quanto do outro, é prejudicial à saúde mental. Por isso sempre é recomendável que, no meio dessa correria toda do dia-a-dia, se possa prestar atenção em nosso próprio comportamento, evitando, assim, que nossa “gangorra” suba sempre para o mesmo lado.

domingo, 1 de agosto de 2010

O pior não é amar sem ser amado, mas ser amado sem saber amar

Relacionamentos amorosos. Tema favorito em terapias, novelas, filmes, livros. Assunto presente em roda de amigos, no intervalo da faculdade, do trabalho, no meio da academia. A gente sabe que é assim e que, lá no fundo, o que a maioria das pessoas quer mesmo é encontrar alguém com quem se possa “viver bem” e ser feliz. A psicanalista Karen Horney já dizia, em 1913, que uma outra necessidade básica inicia quando nos percebemos como indivíduos separados de nossos pais: a carência de amor, de afeto. Segundo Karen, fica-se a vida inteira buscando resolver essa carência, que, por sua vez, só é resolvida quando se é capaz de “dar amor”. Ainda para a psicanalista, o amor que não temos é proporcional ao amor que não damos. No entanto, o que é ser capaz de “dar amor”?

No começo, tudo é muito lindo. O ser humano tem mesmo essa tendência a se entusiasmar com uma novidade, um campo desconhecido, um misto de medo com expectativa, de coragem com total insegurança. Só que a gente sabe que esse “friozinho na barriga” do começo de qualquer relacionamento acaba para todo mundo, e, na minha opinião, é com o que sobra que a gente deve realmente se deslumbrar. É com o dia-a-dia, com um convite descompromissado pra ir ao cinema, com uma ligação de boa noite no meio de uma semana super corrida. Se a gente prestar bastante atenção, vai perceber que é aí que o amor aparece: no nosso cotidiano. Ele vai aparecer em cada momento que o companheirismo se mostrar presente. Ele vai aparecer num sábado a noite qualquer, numa terça-feira pela manhã, numa quinta-feira no meio da tarde, quando a pessoa amada for lembrada por algum motivo banal. O nosso problema é justamente querer sempre mais, quando já se tem tudo.

Se permitir, acho que essa é uma chave importante. Se permitir deixar o orgulho de lado, se permitir perdoar, se permitir se divertir com as pequenas coisas. Se permitir errar, se permitir pedir desculpas. Se permitir ousar de vez em quando, fazer uma surpresa, agradar só por agradar, sem esperar nada em troca. Isso é “dar amor”. Viver um grande amor é completamente possível, no entanto, a dificuldade é não boicotarmos a nós mesmos, deixando que essas pequenas coisas passem em branco, ou, pior, é não perceber que elas aconteceram. É simplesmente não regar o jardim. Termino a postagem com a letra de uma conhecida música dos Paralamas do Sucesso, para refletir: “saber amar, saber deixar alguém te amar”.

sábado, 31 de julho de 2010

Entendendo a Psicopatia - O caso Bruno

Há quase dois meses, um crime chocou o país. Bruno, goleiro e capitão do time de futebol mais popular do Brasil, o Flamengo, é investigado pelo desaparecimento da ex-amante. A polícia está convencida de que ela foi assassinada de forma cruel, e o jogador é o principal suspeito. As evidências apontam que Elisa Samudio foi assassinada e que seu corpo foi jogado aos pedaços para que cachorros famintos o devorassem. Como pode alguém ser capaz de tamanha crueldade? O que passa pela cabeça do autor de um assassinato tão violento?

Um padrão global de desrespeito e violação dos direitos alheios, que se manifesta na infância ou na adolescência e continua na vida adulta. Baixo grau de remorso e culpa, frieza no afeto, manipulação. É assim que o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (o DSM-IV-TR) conceitua o Transtorno da Personalidade Anti-Social, também conhecido como Psicopatia, Sociopatia ou Transtorno da Personalidade Dissocial. O psicopata é aquela pessoa que só pensa em si, só quer levar vantagem, não importa como, ela é capaz de pisar em cima dos outros para conseguir aquilo que deseja. Ele é incapaz de sentir remorso ou culpa, muito pelo contrário, possui uma propensão para enganar, mentir e ludibriar os outros.

O comportamento do goleiro Bruno, seu calculismo e frieza ao programar possível assassinato, além de suas declarações que demonstram uma preocupação exacerbada com sua fama e um menosprezo em relação ao caso quando o mundo a sua volta parece ruir, levaram muitos profissionais da área de saúde mental a acreditar que se trata, sim, de um indivíduo com Transtorno de Personalidade Anti-Social, um psicopata. Para que possamos compreender o que se passa na mente de uma pessoa com tal desvio de conduta, é importante entender algumas coisas. O Sociopata possui uma visão de si como uma pessoa solitária, forte, independente, e enxerga os outros como possíveis vítimas, exploráveis, “trouxas”. Ele acredita que o importante é sempre levar vantagem, que pode fazer o que quiser e puder para se beneficiar. Essas crenças o levam a condutas de roubo, mentira, agressões. No caso Bruno, possivelmente o levou a matar sua ex-amante, com a qual inclusive tivera um filho. Se conseguirmos entender sua linha de pensamento, podemos fazer o seguinte raciocínio: para o goleiro, Elisa era apenas uma mulher com a qual ele poderia se relacionar e obter prazer para si próprio, uma vítima, mais uma pessoa como qualquer outra. Ele não queria um filho dela, ele não queria lhe dar pensão nem qualquer outro benefício. A solução? “Acabar” com ela, afinal, ela é uma “trouxa”. Provavelmente, a partir daí programou sua trágica morte. No entanto, Bruno provavelmente não consegue perceber a crueldade de seu ato, não consegue sentir culpa e muito menos pena do próprio filho, que foi deixado em uma favela após o sumiço da mãe e hoje está sob a guarda do pai de Elisa.

A psicopatia é o exemplo mais puro da crueldade humana, e a estimativa assusta ao mostrar que mais de 1% da população mundial possui tal transtorno de personalidade. Termino a postagem com uma frase do psiquiatra Dr. Roberto Hare, que saiu recentemente em brilhante entrevista nas páginas amarelas da revista Veja: “ O psicopata é como o gato, que não pensa no que o rato sente. Ele só pensa em comida. A vantagem do rato sobre as vítimas do psicopata é que ele sempre sabe quem é o gato”. Para pensar.